sábado, 16 de outubro de 2010

Sentiu vontade de abraçá-lo. Foi vê-lo. Não disse nada. Chorou apenas. Ele chorou também. Fechou o portão e ela se despediu. Os dois deram passos de encontro e pararam no meio do caminho. Apenas se olharam. Suspiraram e pensaram: -Por que não disse nada? Por que não dei o abraço que queria ter dado? Ela voltou pra casa pensando. Não conseguiu olhar pra trás. Resolveu escrever um romance. Queria começar mas ainda não sabia como. Eram tantas histórias, tantos anos. Iniciou duas crônicas. Mais pareciam contos. Não sabia relatar a realidade e o passado. No entanto, era apenas o que conseguia fazer. Por isso os inventava e os colocava de uma forma que só ela entendia o que estava escrito em suas entrelinhas. Deixou tudo ficar subentendido. Não queria que ninguém entendesse as suas palavras. Mas, ele as entenderia. Ele e mais alguns. - E algumas. Em vinte anos vivera apenas seis romances. Se apaixonara apenas duas. Amou apenas uma. Ainda não sabe quem. Está na dúvida, entre karma, missão e sua vontade. Queria amar verdadeiramente Felipe mas, sabia que seu karma era Marcela. Fazia questão de não mudar os nomes em seus contos. Marcela não era seu karma, Vicentina queria que o fosse. A sua missão, ela achava que só poderia ser realizada ao lado de Mateus, ele sim. Ele sim era tudo aquilo que ela queria amar. Mas Felipe... ela nunca sentira nada, nada comparado ao seu sentimento por Felipe. Poderia ele ser seu marido espiritual. Poderia ele ser... quem?! Dúvida. Lembrou de outras paixões. Mas não queria descrevê-las. Enfim, Felipe vivia longe dela. E ela pensava nele todos os dias. Mas pensava também em todas as outras paixões. - Todos os dias. Lembrou-se de Tina. Ela nunca a amou. Não entendia por que estava com ela. Sentiu pena. Sentiu arrependimento. Sentiu que enganou alguém que entregaria sua vida por ela. - Passou. Felipe estava longe. Com outra.
- Outras. Foram tantos corpos. Tanta energia. Tanto prazer. Mas, percebeu que nunca sentira prazer. Nunca sentira nada. Resolveu que nunca amou ninguém. Estava aprendendo a se gostar. Sentiu raiva de todas as pessoas que a conheciam. Não por elas, mas pela imagem que fizera as outras pessoas terem dela. Tocou o foda-se. Na verdade queria mesmo é que todas aquelas pessoas sumissem de seu caminho e nunca mais lembrassem dela. E só. Perdeu o rumo nos seus passos a caminho de casa. Ficou pensando em tantas coisas que por alguns instantes esqueceu que o que a preocupava era o seu sentimento. A quem se declararia? Talvez vinte anos mais sejam o suficiente para descobrir. Esperaria. Estava disposta a entregar a sua vida a Deus por vinte anos e esperar por ele. Sabia que era ele. Pois ela, ah, ela já não importava mais. Pensou em escrever tudo detalhadamente. - Foi ali.



Karin Segalla Ferreira

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Teu nome I

Estava sofrendo. Ligou. Ninguém atendeu. Sentia-o cada vez mais distante, e cada vez mais ela queria tê-lo perto. Parecia uma necessidade, uma condição para que o seu coração batesse mais algumas vezes. Sem demora começou a imaginar o que faria se pudesse fazer tudo o que lhe viria a mente. Iria até ele do jeito que estava. Não importando onde, a distância, nem as consequências dos seus atos. Queria vê-lo. Não suportava mais. Não tinha nenhuma foto para beijar ou relembrar. Só tinha todos os momentos na memória e uma vontade de correr pra perto, onde seu coração se acalmaria. Ah! A calmaria. Hoje se deu conta que só sentia paz com ele. Quando estava perto dele. Ou, quando sentia-o presente. E essa era a questão. Ela não o sentia mais. Tantos anos sem vê-lo deixaram-a cada vez mais longe das lembranças. Tentou fechar os olhos e imaginar seu corpo no dele. Mas não conseguiu. Parecia haver uma névoa de pensamentos fazendo com que ela não pensasse. Não amasse. Mais uma vez teve a certeza que sua vida daria um romance. - Goethe. Cansara de tudo. Já havia desaparecido antes. Trancado a porta dos fundos. Mas dessa vez. Pela última vez, deixou-a aberta. E a porta da frente, e mais todas as outras entradas e janelas. Esperou. Vestiu-se, dessa vez, de esperança. Encheu os olhos de lágrimas e pediu a Deus. - Adeus. Um pedido sincero. Poderia ser o último mas, no entanto, era o primeiro. Assim como ele fora seu primeiro homem. Não de corpo, mas de alma. - Calma. Pensou em parar por ali, tomar uma dose letal de Rivotril e enfim sumir. Sonhar e viver tudo o que almejara. Não foi o que fez. Ou melhor, não foi o que conseguiu fazer. Por que ter que esperar tanto tempo por um amor? - Sei lá. Tinha a certeza que as regras vinham de algo que ainda estava fora da sua mera humana compreensão. - Ou não. No fundo, sabia que tinha que esperar. Sabia que a espera valia, e era tão valiosa quanto o amor que sentia em seu peito. - Em seu corpo inteiro. Deitou-se mais uma vez. Despiu-se. Vestiu-se de amor. Retornou a sua infância. Tomou seus florais e decorou o quarto abrindo a janela. - A luz do sol já podia entrar. Na estante, um livro de Cecília a convidava para viver amores inabaláveis e concretos. Como interpretava. Pra sempre. Será que seu amor era eterno? - Quantas dúvidas. Se perguntava cada vez mais, pra que tudo aquilo? Pra quê as ruas, os poetas, as lágrimas, os desfechos, a saudade e o vão em suas mãos. De que lhe serviria o amor em um momento desses? - De nada, mesmo quando nada é tudo. Só o amor que sentia não lhe moveria as pernas. Precisava de boa vontade e coragem. Não adiantaria ficar ali, estagnada, letárgica, sofrendo e imaginando como seria se... - E se?! Não se moveu. Mas queria. Queria profundamente. Não ligou mais. Esperou. Escreveu tudo o que sentia e chorou. Despiu-se mais uma vez. Dessa vez de pressa. - A pressa, aquela que é inimiga da perfeição. Pensou em mandar uma carta. - Sim! Mandar uma carta seria a solução. Mas, e se ele estivesse viajando? E se ele não sentisse mais nada por ela? - E... Subjuntivos não resolveriam nada. Futuros incertos, muito menos. Pretéritos, aqueles mais que imperfeitos, menos ainda. Escreveu mais. Agora, ainda escreve. Essa história não tem fim. - Nossa história não tem fim.







Karin Segalla Ferreira